A tendência do design sensorial cresceu após a pandemia e pode ser executada pela variação de materiais e texturas
O senso comum, muitas vezes, faz com que o conceito de design se limite ao prazer estético que um ambiente ou produto podem proporcionar. Porém, o desenvolvimento de projetos pode explorar outras possibilidades associadas aos demais sentidos do corpo humano. Um revestimento, por exemplo, pode não apenas ser visualmente agradável, mas também proporcionar sensações por meio do toque, da temperatura e até mesmo do olfato.
O trabalho com os sentidos é o que se convenciona chamar de Design Sensorial, uma tendência que vem ganhando destaque no ramo de arquitetura e interiores, especialmente após a pandemia – período em que o isolamento social levou as pessoas a transformarem suas casas em verdadeiros refúgios de acolhimento emocional. Contudo, a demanda não é necessariamente nova, ainda que a demanda dos clientes não utilizasse tal denominação para explicar o que precisava.
De acordo com o designer de interiores Fabio Galeazzo – que desenvolveu o revestimento Color da marca de pisos de madeira Akafloor –, o design sensorial nem sempre é uma solicitação direta dos clientes. “Muitas vezes, as demandas aparecem de forma subjetiva, derivadas de memórias afetivas que eles não conseguem articular com clareza”. Para o profissional, contudo, é fundamental que os designers utilizem os princípios do design sensorial em seus projetos. “Ao provocar os sentidos, criamos uma conexão mais profunda entre as pessoas e o espaço, considerando também o aspecto cognitivo dessa interação”, explica.
O uso de materiais naturais é o mais recorrente na promoção da sensorialidade em projetos. Madeiras, tecidos naturais, pedras variadas e plantas cumprem a função de estimular os sentidos por meio das texturas, dos visuais e até dos aromas. “A biofilia, por exemplo, é uma presença constante, conectando o interior ao exterior com a suavidade das plantas e a organicidade das formas naturais”, explica o arquiteto e designer de interiores Jorge Elmor. Para o profissional, a iluminação tem também um papel essencial. “Não apenas para clarear, mas para contar histórias ao longo do dia, mudando a atmosfera conforme a luz toca os materiais”.

Deivid de Almeida, designer que desenvolveu a coleção Raízes para a marca de móveis Ancezki, explica que seu estilo pessoal envolve processos afetivos, e por isso o design sensorial surge de forma natural e intuitiva. “No meu ponto de vista, podemos ter ambientes sensoriais e produtos sensoriais, mas o auge só é atingido quando existe perfeita harmonia entre os dois. Claro que com uma iluminação adequada e a pintura das paredes favorecendo já se pode colher grandes benefícios. Agora, se somarmos cheiro agradável, música com frequência favorável e mobília confortável, podemos até transportar um ser humano a outros lugares, só pelos sentidos”, pondera.
A relação de Deivid com o design sensorial se deu, principalmente, por uma questão pessoal. “Sou pai de autista, portanto a sensorialidade tem um peso muito alto e é coisa séria. Após a paternidade, consegui distinguir claramente casa de lar e é aí que tudo começa a fazer sentido. Antes, esse assunto não era relevante para mim. Pensamos que é sobre matéria, mas no final é sempre sobre o indivíduo e o meio que ele vive”, conclui.

Relação com o cliente
Jorge Elmor explica que, para o sucesso do projeto, é necessário conhecer bem as intenções dos clientes. “Realizamos uma pesquisa profunda para entender quais sentimentos eles gostariam de experimentar no espaço – seja paz, aconchego ou inspiração. A partir dessas respostas, construímos o conceito do projeto, pensando em cada detalhe que possa evocar essas emoções. Embora isso possa ser aplicado também em interiores e décor, é ideal que essa abordagem já faça parte da concepção arquitetônica para que o espaço realmente reflita essas intenções desde sua essência”, diz.
Para Fabio Galeazzo, a relação custo-benefício de um projeto baseado em design sensorial pode variar, mas os benefícios superam os custos na maioria dos casos. “Embora a aplicação de materiais sensoriais e a atenção aos detalhes possam aumentar o investimento inicial, os resultados em termos de conforto, bem-estar e satisfação dos usuários tornam o custo justificado”. De acordo com o designer, ambientes que promovem uma conexão sensorial tendem a causar um impacto emocional positivo, o que pode aumentar o valor percebido do espaço ao longo do tempo. “Essa abordagem também pode contribuir para a sustentabilidade, ao promover uma relação mais duradoura e significativa entre os indivíduos e seu ambiente”, afirma.
Linda Martins, designer que assina a coleção Cecília para a DonaFlor Mobília, opina que os principais benefícios do design sensorial estão na criação de uma conexão mais profunda e emocional com o usuário. “Ativa os sentidos de forma sutil, proporcionando conforto e satisfação que vão além da estética. Produtos e espaços que levam em consideração os sentidos tendem a ser mais memoráveis e a oferecer uma experiência mais imersiva, o que é particularmente importante em ambientes residenciais e de hospitalidade”.

Desenvolvimento de produtos
Para que os projetos de arquitetura e interiores tenham uma sensorialidade refinada, é preciso que os fornecedores entreguem produtos alinhados com tais demandas. Segundo Daniel Mosa, arquiteto e analista de marketing da Formica, a diversificação dos revestimentos permite que o design sensorial seja bem executado. “Os projetos de arquitetura e decoração estão cada vez mais personalizados, então é natural que especificadores e consumidores nos tragam demandas que não raro avançam ao nível do detalhe, como é o caso das texturas. Por isso, entregamos possibilidades que vão além da cor”, afirma.

A design Karol Suguikawa, que assina o Sofá Bacio da Breton, diz que há situações em que os clientes pedem que os produtos despertem sensações que vêm de formas sinestésicas – ou seja, misturam os sentidos –, e tocam profundamente as memórias visuais e afetivas de cada um. Isso exige o uso de soluções específicas. A curva suave do Sofá Bacio remete ao formato dos lábios, criando uma sensação tátil de conforto. O tecido drapeado traz textura e uma experiência refinada. Esses elementos não só atraem visualmente, mas também proporcionam uma conexão emocional e sensorial”.
Segundo a profissional, a pandemia impactou a forma como as pessoas se relacionam com os produtos. “Antes as pessoas compravam sofá pela cor. Hoje o tecido e composição dele importam e muito. Também foi depois da pandemia que o desejo por sofás acinzentados aumentou claramente, pela proximidade dos moletons que tanto usamos naquele período”, analisa.

Para o arquiteto Rodrigo Ohtake, o usuário não deveria precisar dizer o que espera de uma peça ou projeto, mas indicar a usabilidade desejada. “A nossa função é entender e entregar mais, o inesperado, o inusitado, de modo que a pessoa receba e se surpreenda por desconhecer que realmente precisava daquela entrega”. O profissional cita como exemplo as cubas que assina para a coleção Ohtake das cerâmicas Roca: “O que entregamos além da funcionalidade é uma questão visual também, para que a pessoa, ao entrar no espaço, tenha orgulho do banheiro onde a peça está instalada. Além da usabilidade, a beleza, o inusitado e a surpresa, para nós, são muito importantes.”

A comunhão entre design e tecnologia pode ser um diferencial na hora de proporcionar uma experiência sensorial mais completa, permitindo, por exemplo, que um mobiliário tenha opções de ajustes em altura e angulação que expandem as possibilidades de uso. É o que defende Pasquale Junior Natuzzi, diretor criativa da Natuzzi, marca italiana de móveis: “A síntese desse conceito é que quando falamos em conforto não estamos falando apenas de ergonomia e conforto físico, mas também de conforto espacial. Estamos atentos à micro mobilidade, ao impacto na posição, ao impacto na respiração. Refletir e conceber um produto é imaginar como ele responderá a um certo movimento, a um certo espaço”

Gisele Bettiol Passos, designer da DOM DAQUI Tapetes, afirma que a combinação de texturas, a mesclas de materiais naturais, como lã e algodão, o uso de cores vibrantes e o design em alto relevo são estratégias utilizadas para estimular os sentidos, o que se conecta com as novas demandas do público. “Com o aumento do trabalho remoto, há uma maior demanda por tapetes confortáveis para pisar e deitar. Os consumidores apreciam a multifuncionalidade desses produtos, que podem ser usados para exercícios, meditação ou relaxamento. Embora muitos já conheçam essas opções, ainda há espaço para educar novos consumidores sobre os benefícios do design sensorial”, finaliza.

Por Victor Hugo Félix.